POR ELENILTO SALDANHA DAMASCENO: A segunda fase da linguagem

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Conforme o crítico literário canadense Herman Northrop Frye, a segunda fase da linguagem, denominada hierática ou metonímica, afirma-se com o progressivo e decisivo desenvolvimento da escrita. Essa segunda fase, a partir “de Platão, recua do poético para o dialético, um mundo de pensamento separado do mundo físico da natureza, e em alguns aspectos superior a ele”. A partir da transição de fases, a linguagem poética e descontínua dos versos passa a ser acompanhada da linguagem retórica e contínua da oratória hierática e da prosa comum.

A nova fase da linguagem desponta na Grécia clássica e é própria de uma cultura ascendente, em que “as palavras tornam-se sobretudo a expressão exterior de pensamentos ou ideias interiores. Sujeito e objeto tornam-se mais consistentemente separados”. Segundo Frye, “a base da expressão aqui está se movendo do metafórico, com seu sentido de identidade entre homem e natureza […] (‘isto é aquilo’), para uma relação muito mais metonímica (‘isto está no lugar daquilo’). Especificamente, palavras ‘estão no lugar’ de pensamentos, e são a expressão exterior de uma realidade interior. Mas esta realidade não está apenas ‘dentro’. Pensamentos indicam a existência de uma ordem transcendental que se situa ‘acima’; apenas o pensamento pode se comunicar com essa ordem e apenas as palavras conseguem expressá-la”.

Para Frye, o conceito platônico da Forma do Bem e o conceito aristotélico da Origem do Movimento apontam para “uma ordem superior de que apenas a linguagem, em suas formas matemática ou verbal, pode se aproximar”. Forma-se uma unidade entre a linguagem e a consciência dessa ordem superior, e “essa concepção unificadora torna-se um ‘Deus’ monoteísta, uma realidade transcendente de um ser perfeito para o qual aponta toda a analogia verbal”, representado como ordem ou ser superior, imutável e além de todas os seres e objetos. Essa “concepção de um ‘Deus’ transcendente desloca-se para o centro da ordem das palavras”. O vocábulo Deus é um substantivo, e “praticamente o único instrumento gramatical para dar a entender este sentido do imutável é o substantivo abstrato”.

Quanto à palavra que designa a entidade humana que usa a linguagem nessa fase, Frye destaca que, “à medida que se desenvolviam o pensamento metonímico e o seu Deus monoteísta, passou-se a pensar o homem como uma única ‘alma’ ”.

Por fim, ao relacionar essa segunda fase a sua respectiva Literatura, observa a distinção entre linguagem figurada (conotada) e literal (denotada). É aí que a Literatura “se transforma no uso deliberado e consciente de figuras de linguagem”. O gênero verbal proeminente passa a ser a retórica, e “o orador fez-se o símbolo de um ideal cultivado de versatilidade e fluência; isto o tornou de certo modo o sucessor do poeta da fase anterior enquanto o mestre da sua sociedade, o depositário enciclopédico da sua tradição”.

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