O Fórum da População em Situação de Rua, conduzido pelo Círculo Operário Leopoldense (COL), foi o tema de debate do Berlinda Entrevista dessa sexta-feira (30). As demandas dos moradores de rua, mobilizações sociais e a participação do poder público na ajuda aos necessitados, sobretudo com a chegada do frio intenso, foram os principais assuntos abordados junto a Jean Cardoso, mobilizador social do COL.
Histórias que mostram resistência
Jean frisou a necessidade, tanto de entidades públicas como da própria sociedade em geral, de promover uma escuta ativa e propositiva junto aos moradores de rua. Ele considera que a preocupação inicial de quem ajuda, geralmente é levar alimentos e roupas, sem conhecer as verdadeiras necessidades de quem é ajudado. “Ouvi-los é essencial”, aponta Jean, relembrando uma história curiosa:
“Há um senhor que geralmente fica no entorno dos Bombeiros, o Seu Ilo. Ele geralmente é visto lendo pelas ruas e sabemos que ele possui formação em história. E é difícil se aproximar dele. Recentemente ele nos procurou para tentar a vinculação, mas é difícil ele permanecer lá, porque quando vincula é feito o acolhimento, e me parece que ele tem uma certa resistência a isso. Ele prefere ficar em seu espaço na rua mesmo”, conta.
Três eixos do Fórum
O COL criou o programa Rua em Ação, estruturado em três frentes:
- Fortalecer movimentos sociais e coletivos
- Atender demandas específicas, como alimentação e trabalho
- Diagnosticar realidades para propor soluções viáveis
“Este é o único espaço de fala que eles têm. Queremos ouvir suas dificuldades e, juntos, construir caminhos”, explica Jean.
Alimentação em foco e o desafio dos restaurantes
Com a previsão da noite mais fria do ano, Jean alertou para a insegurança alimentar crônica: “A maior parte dos moradores de rua faz apenas uma refeição por dia, o que não supre as necessidades energéticas em temperaturas baixas. No frio, o corpo consome mais calorias para se manter aquecido.”
O COL tem levado esta pauta ao Conselho de Segurança Alimentar e articulado com a Secretaria de Assistência Social (SAS) a ação “Inverno POP”, que une alimentação, vacinação contra a gripe e orientações médicas. Segundo material de apoio, apenas na tarde de 26/05 o Centro POP atendeu 35 pessoas, oferecendo almoço, escuta especializada e emissão de documentos.
Jean também apontou a atuação da Guarda Municipal, segundo os moradores de situação que fala em multa a restaurantes que doam marmitas: “Por conta dessas fiscalizações, muitas vezes a comida é descartada no lixo. Moradores chegam a dar voltas no quarteirão pedindo sobra de marmita. Eu entendo a posição dos estabelecimentos, mas não deixa de ser degradante”, avalia.
Ponderação dos ouvintes
Sobre o tema, ouvintes do Berlinda Entrevista se manifestaram no sentido de que “boa parte do povo que está na rua, está lá por que quer”. Citando ainda que “alimentar não vai ajudar e isso pode piorar a situação, pois deixarão de trabalhar e vão seguir ocupando as ruas, especialmente na região central, onde os restaurantes oferecem o alimento”.
Jean apontou que entende este pensamento, porém reflete: “Não dar comida, com o intuito que de o morador vá embora e não apareça mais, vai contra uma boa índole de querer ajudar o próximo. Mas claro, é preciso entender que existe sim uma responsabilidade do Poder Público sobre isso. Constitucionalmente falando, quem deve fazer essa oferta de alimentos inicialmente é o Estado”.
Sobre este apontamento do ouvinte, foi repassada a questão ao secretário de Segurança de São Leopoldo, Alexandre Rosa, referente a fiscalização da GM em casos desta natureza. Ao Berlinda ele informou que quem deve falar sobre a questão dos moradores de rua, é a secretaria de Assistência Social.
Fórum da População em Situação de Rua: voz e diagnóstico
O Fórum reuniu no último encontro 25 usuários, entre homens e uma mulher, convocados por Jean após contagem de pessoas em torno do Centro POP e região central. “O morador de rua é invisível, e o idoso, ainda mais. Queremos dar voz a quem não tem casa, emprego ou família, escutando suas propostas de solução, como o acesso a refeições quentes e abrigo seguro,” explica Jean, que atua no COL há 25 anos.
O Ministério Público estimou 321 pessoas em situação de rua durante as enchentes de 2024, que tinham algum benefício social em haver. No entanto, mas Jean alerta que esse número varia com migrações internas e não há um número oficial sobre esta população de rua. “Precisamos de dados atuais para planejar políticas eficazes”.
Quase um século de atuação
Para celebrar os 90 anos do COL, uma sessão solene será realizada na Câmara em 9 de junho. Jean, que participa do projeto há 25 anos, enfatiza a missão: “O morador de rua é invisível e isso machuca eles. Termos este projeto é a oportunidade de gerar medidas representativas, com o apoio do Poder Público e seus diversos mecanismos”, assegura.
Acompanhe o Berlinda Entrevista na íntegra: [embedyt] https://www.youtube.com/watch?v=NSZDI6PNGGg[/embedyt]