Transplante de órgãos: quando uma vida pode salvar oito

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“Por 30 anos tive pressão alta e devido a isso perdi a função renal. Então três vezes por semana vou ao Hospital Centenário fazer hemodiálise. Cada sessão dura 4 horas. Por isso, preciso de um transplante de rim. Estou na fase dos exames, mas estão parados por conta da pandemia. Só depois dos exames é que poderei ir para a fila de espera. Só na sala da hemodiálise do Centenário, dos 7 pacientes, 6 precisam de uma doação de órgão. A pressão alta é hereditária, mas eu também fumei durante anos. Se eu pudesse voltar atrás… Hoje tenho uma vida saudável porque parei de fumar e mudei minha alimentação, mas dependo de uma máquina para sobreviver. Dependo de um transplante pata continuar vivo.” Esse foi o relato do paciente Wilson Klein, 66 anos, que esteve na manhã desta quarta-feira no estúdio do Berlinda News falando sobre a importância da doação de órgãos.

Klein é apenas um entre milhares de brasileiros que atualmente têm a esperança de conseguir um novo órgão para seguir vivendo. De acordo com a enfermeira do Hospital Centenário e integrante da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Transplantes (CIHDOT), Fernanda Estrella, que também esteve no programa
Berlinda News Entrevista, o Brasil tem hoje uma lista de espera para transplantes de 40 mil pessoas. O número é assustador e deveria nos fazer pensar: “E se pudéssemos doar um órgão e salvar vidas? E se fossemos nós a precisar de uma doação?”

Foto: Juliano Palinha

Foi levando essas perguntas em consideração que em 2014 foi criada a CIHDOT, formada por quatro enfermeiras e um médico que têm como missão conversar com as famílias que perderam algum ente querido sobre a importância da doação. “Só paciente que teve morte encefálica é que está apto a doar. E normalmente esbarramos em duas dificuldades que muitas vezes impedem este gesto: questões religiosas e o fato do paciente não ter deixado claro para os parentes que gostaria de ser um doador. Sabemos que não é uma conversa fácil e nem agradável, mas é necessária e importante. Atualmente a legislação brasileira dá para a família esse poder de decisão. Se a pessoa deixa a informação na carteira de identidade, por exemplo, ou até mesmo em alguma rede social, facilita bastante o avanço da conversa com as famílias, pois o desejo do paciente está ali, registrado. É esse trabalho que fazemos de forma exaustiva e diariamente no Hospital Centenário”, contou ela que está concluindo uma pós-graduação em doação e captação de órgãos.

Segundo Estrella, o trabalho de conscientização é feito constantemente e em tempos normais, sem pandemia, vai além dos muros do hospital. “Vamos a programas de rádio, escolas, tentar mostrar o quão importante é tomar esta decisão ainda em vida e comunicá-la para a família como um todo. Muitas vezes, um parente aceita e outro não. Quando é assim, respeitamos o impasse e deixamos nossos canais de comunicação abertos para que tirem dúvidas e nos comuniquem da decisão final. Nós também pensamos no lado humano dessas famílias, em como elas ficarão depois de passarem por esta situação. Nós da Comissão também temos esta sensilibilidade para entender uma resposta negativa da família. Muitas vezes os pacientes são pessoas que estavam bem há meia hora atrás e de repente
faleceram por algum acidente. É um impacto receber uma notícia dessa”, explicou ela que ressaltou também que muitos dos cursos feitos pelos integrantes da CIHDOT são pagos por eles mesmos.

Corrida pela vida

Um salva 8. Esse é o lema e a hashtag usada pela Comissão nos trabalhos feitos e divulgados, e a explicação é simples: uma pessoa quando diagnosticada com morte encefálica pode doar oito órgãos, além da pele. É possível transplantar as córneas, os pulmões, os rins, o fígado e o coração. Conforme a enfeirmeira Estrella, o Estado do Rio Grande do Sul possui o maior banco de peles da América Latina e normalmente pessoas que veem a falecer por AVC, morte súbita ou acidentes, são aqueles que acabam sofrendo morte encefálica e estão aptas a doarem. “Percebam que são mortes repentinas. Por isso a importância de ainda em vida conversar com a família e deixar claro o desejo de ser um doador. Uma pessoa pode literalmente salvar oito”, ressaltou ela que também deixou claro que pacientes com Covid-19 que não sobrevivem, não podem ser doadores. “O paciente que recebe o órgão precisa tomar medicações que baixam a imunidade. Por isso, é perigoso transplatar um fígado ou um coração de alguém que faleceu por Covid-19.”

Quando o sim da família vem, o trabalho para a retirada e transporte dos órgãos deve ser rápida e organizada. Geralmente, todo o procedimento é feito de madrugada para pegar as rodovias vazias e não perder tempo. “Cada órgão tem um tempo entre a retirada e o implante. Por isso, é necessário montar toda uma logística. Quando precisamos, acionamos a Polícia Rodoviária Federal que faz a escolta e nos ajuda durante o transporte”, contou Estrella.

Drive Thru da Conscientização

E o trabalho da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Transplantes não para nunca. Não é possível prever quando será necessária a presença de uma das enfermeiras integrantes no Hospital para conversar com familiares. Às vezes, poder ser até de madrugada. As incansáveis se unem até nos finais de semana se assim for preciso. Dia 26, por exemplo, elas farão o Drive Thru da Conscientizão dentro da programação do Setembro Verde. Das 10h às 12h, no estacionamento do Hospital Centenário serão entregues materiais informativos e brindes para aqueles que têm dúvidas sobre o assunto ou que querem saber um pouco mais. Tudo
será feito dentro do protocolo de segurança do Covid-19. Além disso, a partir de hoje, na página do Hospital Centenário no Facebook, serão divulgados vídeos de sensibilização com relatos de pessoas que já receberam algum órgão ou que ainda estão na fila de espera.

Criança também doa, criança também recebe

Imagem: Instagram Estelinha

Transplante não é brincadeira, é assunto sério e as pequenas Laura Franco, 8 anos e Maria Estela Rezende de Souza, 12 anos, sabem muito bem disso. A dupla Laurinha e Estelinha desde cedo, sabem o que é lutar pela vida. Laura, com quase um ano de idade, precisou passar por um transplante de fígado que recebeu do seu irmão, que na época, tinha 19 anos. Antes, porém, a menina precisou fazer três cirurgias em menos de 20 dias. “A gente, esse tempo que fica no hospital, vai sendo preparada. Ali você vê que há tantas coisas maiores e casos de vitória. Eu sempre digo que você nasce para ser mãe, mas mãe de hospital você aprende a ser”, contou a advogada e mãe da Laura, Deyse Franco, 52 anos, que precisou ficar no ambiente hospitalar por quase um ano lutando para a salvar a vida da filha.

Já Estelinha, está na fila de espera por um pulmão. Natural de Minas Gerais, mas atualmente vivendo no Rio Grande do Sul, a menina está a espera de um pulmão que seja compatível com o seu corpo de criança. As duas, segundo Deyse, se conheceram pela internet, por meio do assunto em comum e hoje farão no Instagram uma Live para informar e conscientizar as pessoas sobre a importância de ser um doador. “Elas inclusive vão falar de um livro infantil em que o tema é transplante e que incentiva este gesto dizendo que você começa doando uma boneca e acaba doando uma vida. Através do amor, a vida prossegue. Por meio de um sim, você pode multiplicar muitas vidas”, ressaltou Deyse. A Live vai ser no perfil da Estelinha no Instagram (@respiratete), nesta quarta-feira, 9, às 19h.

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