No discurso narrativo literário, o narrador é a representação da instância do sujeito falante o qual se dirige, eventualmente, a uma representação de interlocutor, o narratário. Ambos são criaturas fictícias, que se comunicam no contrato de tempo estabelecido na narração e se diferenciam das figuras de autor e leitor, que se comunicam no plano da realidade humana.
De acordo com os críticos literários e professores portugueses Ana Cristina Macário Lopes e Carlos António Alves dos Reis, o texto narrativo, como qualquer tipo de texto, “pressupõe sempre uma instância doadora do discurso”. Na narrativa literária, esse papel é desempenhado pelo narrador. Conforme a professora gaúcha Juracy Ignez Assmann Saraiva, “o ato produtor da narrativa – o discurso – adquire forma pela mediação do narrador. É através desse agente, forjado pelo artifício da palavra, que os acontecimentos são expostos. É ele quem coloca as personagens em cena, invade seus pensamentos, adere a seu olhar, adota seus pontos de vista e descreve seu entorno, fazendo-as desfilar diante do leitor como se tivessem vida própria e prescindissem dessa voz que as enuncia”. O narrador é o emissor da narrativa, é a voz que narra. É uma criatura fictícia, criada pelo autor textual para atuar como o sujeito do discurso. O crítico literário, escritor, filósofo e sociólogo francês Roland Barthes define-o como um “ser de papel”. Essa entidade fictícia executa, organiza e rege o ato de enunciação e ainda pode exercer funções complementares como intrusões, apreciações, comentários, manifestações ideológicas, repetições.
Assim como existe um emissor do discurso no plano da narração, também existe, ocasionalmente, um receptor da narrativa. Segundo Vítor Manuel Pires de Aguiar e Silva, crítico literário e professor português, o narratário é o “destinatário intratextual do discurso narrativo”, o qual se apresenta como uma personagem que pode desempenhar apenas essa função específica, ou ainda intervir na trama. O narratário é esse receptor da narrativa. É uma criatura imaginária, criada pelo autor textual; também é um “ser de papel”. Essa entidade fictícia é variavelmente visível por intermédio das marcas do discurso apresentadas pelo narrador. Contudo, o narratário intratextual não é um elemento constitutivo essencial no plano da narração, sendo sua existência e visibilidade totalmente dependente do discurso do narrador. Ainda conforme Vítor Silva, “nos textos narrativos em que existe um narrador autonomizado, personalizado, pode existir, ou não, um narratário, pois nenhuma regra ou convenção obriga o ‘eu’ que narra a endereçar o seu discurso a um ‘tu’ intratextualmente construído e particularizado como entidade ficcional”.