Em artigo anterior*, foi observado que, no plano da narração ou plano intratextual da narrativa, ocorre a comunicação entre emissor-narrador e receptor-narratário. Já este artigo analisará o plano extratextual, no qual se estabelece a comunicação entre autora ou autor e leitora ou leitor empíricos.
Por vezes, quem lê uma narrativa literária confunde narrador e narratário, respectivamente, com autora/autor e leitora/leitor. A professora gaúcha Juracy Ignez Assmann Saraiva esclarece que, assim “como as personagens, narrador e narratário assumem um caráter ambíguo: por ser responsável pela enunciação narrativa, o narrador confunde-se com o autor, papel que representa no relato: da mesma forma, o narratário atua como ouvinte e intérprete sem, contudo, identificar-se com o leitor real. Narrador e narratário, autor e leitor fazem parte de estatutos ontológicos e funcionais distintos: os dois primeiros assumem o discurso ou a enunciação da narrativa, sendo personagens; já o autor é o responsável pela criação do texto, enquanto o leitor o interpreta, pertencendo ambos ao plano do real”.
De acordo com o crítico literário, escritor, filósofo e sociólogo francês Roland Barthes, nesse plano do real ou plano extratextual, o doador da narrativa é uma pessoa que “tem um nome, é o autor, em que se trocam sem interrupção a ‘personalidade’ e a arte de um indivíduo perfeitamente identificado, que toma periodicamente a pena para escrever uma história”.
No entanto, a obra literária só se concretiza totalmente com a participação da leitora ou do leitor. Enquanto não lida, a narrativa literária é discurso desconhecido, incomunicado. O extraordinário fenômeno literário, as múltiplas possibilidades de leituras, concretiza-se nas mentes de leitoras e leitores. Daí a importância de educadoras e educadores na estimulação a hábitos e competências de leitura.
Segundo as pesquisadoras e professoras argentinas Ana María Kaufman e María Elena Rodríguez, “os leitores, então, devem unir todas as peças em jogo: a trama, as personagens e a linguagem; têm de preencher a informação que falta para construir o sentido, fazendo interpretações congruentes com o texto e com seus conhecimentos prévios do mundo. Os textos literários exigem que o leitor compartilhe do jogo da imaginação para captar o sentido de coisas não ditas, de ações inexplicáveis, de sentimentos não expressos”.
Além do acesso ao letramento literário, tanto mães e pais quanto a escola são essenciais para que as crianças se tornem boas leitoras e bons leitores. As crianças precisam ter acesso a bons livros, que enriqueçam e ampliem gradativamente suas experiências enquanto leitoras e leitores. Além disso, o hábito e o apreço pela leitura serão bastante potencializados se elas observarem que a leitura literária é importante a partir do exemplo demonstrado por mães, pais, professoras e professores leitores.
* Distinção entre narrador e narratário
Disponível em: https://berlinda.com.br/2023/06/20/por-elenilto-damasceno-distincao-entre-narrador-e-narratario/