POR ELENILTON DAMASCENO II Itan: a criação do mundo na versão yorubá

6 de dezembro de 2022 - 16:14
Por Elenilto Saldanha Damasceno é professor, escritor e jornalista

Cada cultura cria e compartilha narrativas que fundamentam e organizam representações coletivas sobre o mundo e a existência. Essas histórias, transmitidas entre gerações, constituem mitologias que se enraízam e perduram como tradição e legado ancestral.

Em todas as culturas, é recorrente a criação de mitologias sobre a origem do Universo, da Terra, da natureza e da vida humana, as quais apresentam em comum elementos de expressividade literária, como linguagem simbólica, estrutura narrativa, metáforas. Esses elementos e representações literárias, de certa forma, contribuem para alçá-las a um plano além do concreto/empírico, fazem-nas alcançar um plano transcendental geralmente associado à espiritualidade.

Recentemente, uma interessante e bela exposição tem circulado em espaços culturais e educacionais para apresentar uma dessas narrativas sobre a criação do Universo e da vida. “Itan: a criação do mundo na versão yorubá” é uma exposição artística composta por 32 pequenos painéis: 16 apresentam textos, 16 apresentam imagens. O texto é de autoria da contadora de histórias, escritora e professora Indiara Tainan. As imagens são obras do talentoso ilustrador, também escritor e professor Jader Santini. Ambos são professores na rede pública de ensino de São Leopoldo.

A palavra “itan”, na língua yorubá, significa história, narrativa. O referido itan que relata a criação do mundo na versão yorubá apresenta Olodumarê, criador do Orum (o Céu, o mundo espiritual), do Universo e pai dos orixás, entre os quais Oxalá, Exu, Oduduwa, Nanã. Também representa a criação do Ayê (a Terra, o mundo físico) por Oduduwa e a criação dos seres humanos por Nanã e Oxalá. No mito, as criaturas humanas são originadas a partir da argila e recebem vida através de um sopro de Oxalá em suas narinas.

Observa-se que esse itan dialoga diretamente com a mitologia judaico-cristã sobre a criação dos seres humanos, apresentada nos capítulos iniciais de Gênesis: “E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente” (Gênesis 2.7). Ambas as narrativas apresentam uma divindade suprema criadora do Universo e da vida, representam a criação da vida humana a partir da própria natureza (da terra) e de um sopro (ruach, em hebraico) da divindade criadora como a fonte da vida.

Ao conhecer essas mitologias, nota-se o quanto dialogam entre si e estabelecem uma rede de representações simbólicas que aproximam coletividades de diferentes épocas e espaços. Em nosso país, com tanta diversidade e riqueza cultural, mas também com tanta intolerância religiosa, é muito importante que se conheça e se estabeleça pontos de confluência entre mitologias e crenças, pois tais elementos comuns, em diálogo, nos irmanam como filhas e filhos de um Criador, criados de forma maravilhosa e com amor.

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